Ultimo
Dia: Prólogo.
Olhou
na direção da janela aberta. Na direção, que ele se encontrava.
A
menina levantou e caminhou. Ele ficou parado e surpreso, sem se
mexer. Ela andou
ao encontro dele, rostinho sereno, cabelos loiros escorridos. A vela
queimava, e à chama ardente, iluminava. A lufada de frio, invadia
o pequeno quarto. Com
coragem, a
menina,
se
aproximou.
Primeiro
Dia:
A
criança acende todos os dias uma vela.
Ajoelhou,
juntou as mãozinhas, fechou os olhos bonitos que ganhou, e rezou
baixinho.
Primeiro,
para o menino Jesus, depois, Maria e José. Rezou para o Papai do
céu, pra iluminar as vidas da mamãe e do irmão. Terminado, pediu
aos anjinhos, cuidarem dela e começou outra oração, a pedir, e a
rezar, com devoção.
Sempre
ali, a observar a menina. Sempre vigiou, ouvindo a voz da pequena.
Ele não se moveu, estava silencioso, no seu cantinho intimo.
Às
vezes, o pensamento escapava, fazendo com que se perdesse, e
demorasse a compreender em qual parte, encontrava-se
a oração.
Ficou
calado, pra não atrapalhar. De vez em quando, olhava, para que
pudesse abrir um riso tímido, para a menina.
Tinha
sete anos, a
menina.
O irmão, oito. A mãe, com os nervos à flor da pele. Era
bastante estourada, uma bomba pronta, pra explodir.
Nos
últimos dias, esteve muito nervosa. A pressão chegou lá no bico.
Tiveram que levá-la para o hospital. Agora, precisa tomar de seis em
seis horas o comprimido, para manter a pressão equilibrada.
A
reza acabou. Fizera
os pedidos e os agradecimentos que precisou.
Ficou
de pé, espreguiçou o seu magro corpinho. O menino
entrou. Ela o olhou. Nada falou. Ele pegou o caderno abandonado na
cama, e puxou o cabelo dela.
– Ai!
A
vela queimava. Descobriu com a mãe, que precisava ser apagada
sozinha. Aprendeu desde pequena, a avó, ainda viva.
– Senão, nossos pedidos, orações e proteções, não são atendidos. – Explicou ela.
– Senão, nossos pedidos, orações e proteções, não são atendidos. – Explicou ela.
E
com a explicação, deixava-se derreter a vela. Concluiu
que desse modo, chegaria fácil, no ouvido do Papai do céu.
O
menino, não era pra rezas e orações. Oficio, somente
da
menina. A mãe não tinha tempo, ocupava seus afazeres, com problemas
da casa.
A
mãe chegou. Escutando o grito da menina. Lançou uma cara feia, para
o menino.
– Que fez com sua irmã? – Perguntou.
– Nada não. Ela que faz graça.
– Puxou meu cabelo! – A menina dedurou.
– Que fez com sua irmã? – Perguntou.
– Nada não. Ela que faz graça.
– Puxou meu cabelo! – A menina dedurou.
A
mãe nem falou. Havia fumaça, saindo da cabeça dela.
O
menino abaixou as orelhas e saiu de mansinho. Escapou dali, indo para
a sala.
– Vamos. Isso passa. – Disse, ao colocar a mão no cabelo loiro da menina.
– Vamos. Isso passa. – Disse, ao colocar a mão no cabelo loiro da menina.
E
ali quieto, e sem se mover, via as duas. A mulher o encarou. Pensou
que deveria falar com ela, de que não precisava ficar brava, com o
menino.
– Vamos. Feche o quarto. Daqui a pouco, à vela, se apaga. – Ela disse, e não parava de encará-lo.
– Vamos. Feche o quarto. Daqui a pouco, à vela, se apaga. – Ela disse, e não parava de encará-lo.
E
ele também saiu quietinho.
Seguiu-as, para a sala. Andou cauteloso. Não quis chamar atenção. Examinou o ambiente da casa, um tanto escura, com mínima luminosidade vinda das lâmpadas.
Seguiu-as, para a sala. Andou cauteloso. Não quis chamar atenção. Examinou o ambiente da casa, um tanto escura, com mínima luminosidade vinda das lâmpadas.
Na
sala, o garoto se escondeu dentro do caderno. A televisão, estava
ligada na novela. Horário das dezoito horas. Ao passar a menina
estapeou
a cabeça do menino.
– Ai, mãe! – Ele chiou.
– Ai, mãe! – Ele chiou.
–
Silêncio!
– Ordenou, sem interromper a caminhada. Sentou na poltrona, que era
só dela, de posição melhor para assistir TV. A menina sentou na
poltrona maior, do lado do menino.
– Quem começou a me bater foi você. – Disse a menina.
– Calem a boca. Quero ver minha novela sem nenhum pio. – Falou a mulher, lançando um olhar furioso para os dois.
– Quem começou a me bater foi você. – Disse a menina.
– Calem a boca. Quero ver minha novela sem nenhum pio. – Falou a mulher, lançando um olhar furioso para os dois.
Timidamente,
ele
sentou numa pequena vaga que encontrou. Estava bem desconfortável,
difícil de se
acomodar.
Posição
ruim, não conseguia assistir a TV. Restou ouvir, o que à novela
narrava.
Na
decoração, pendurado na parede, o quadro do Preto Velho, o outro de
Iemanjá e um de São Jorge, matando o dragão. Havia o altarzinho,
para uma pequena imagem, de outro Preto Velho, enfeitado de fitas
vermelhas, amarelas, brancas e verdes.
Atraiu-o
para lá. Tocar a imagem ou ficar, apenas próximo.
Esboçou
uma saída. Olhou pra mulher, que se encontrava, distraída.
Levantou,
e andou de mansinho.
– Não vá, se afasta daí! – Gritou a mãe.
Com medo, voltou no seu cantinho. Assustado, percebeu que não foi com ele, que ela tinha gritado. Constrangido, se encolheu. Não falou palavra alguma.
– Idiota. Burra. – A mulher xingava a personagem da novela.
– Ai! – Reclamou a menina.
– Não vá, se afasta daí! – Gritou a mãe.
Com medo, voltou no seu cantinho. Assustado, percebeu que não foi com ele, que ela tinha gritado. Constrangido, se encolheu. Não falou palavra alguma.
– Idiota. Burra. – A mulher xingava a personagem da novela.
– Ai! – Reclamou a menina.
O
menino beliscou disfarçadamente a menina.
Os dois entraram
numa briga. Tapas e mais tapas.
– Ei, ei, ei! Podem, parar já! – Ordenou a mãe, que fez os dois, se encolherem. – Saco!
– Ei, ei, ei! Podem, parar já! – Ordenou a mãe, que fez os dois, se encolherem. – Saco!
No
quarto, a vela estava derretida. Observou a menina arrumar a cama
dela. O menino, arrumou apressadamente a sua cama, e num impulso,
pulou e deitou nela. Antes de deitar, a menina,
ajoelhou-se, colocou os braços em cima do colchão e pediu proteção,
ao anjo da guarda. Rezou o Pai-nosso, e em seguida, deitou e se
cobriu, com o cobertor.
A
mãe entrou. Camisola cor-de-rosa. Olhou para ele. Não disse
nada.
Beijou os filhos.
– Durmam bem.
– Você também, mamãe. – Responderam.
O dia terminou.
Beijou os filhos.
– Durmam bem.
– Você também, mamãe. – Responderam.
O dia terminou.
Segundo
Dia:
Levantaram
cedo. Tomaram café, vestiram roupas de sair e foram as compras.
Compraram
mais baboseiras, do que as necessidades. As crianças armaram um
barraco por causa de uma marca de bolacha de recheio, a mãe precisou
intervir.
Os
acompanhou, pra dar alguma opinião. Contentou-se somente, como uma
desconvidada companhia.
Na
volta, precisou se esquivar do cão vira-lata sarnento, que cismado,
latia no seu calcanhar, além de atrapalhá-lo, a ajudar a carregar
às sacolinhas.
No
almoço, comeram macarronada e a mãe, permitiu que as crianças
tomassem refrigerante.
De noite, foram na umbanda, próximo ao quartel da polícia militar.
De noite, foram na umbanda, próximo ao quartel da polícia militar.
Religião
da família. Geração de avó para bisavó e bisnetos.
O
menino não tinha vocação, mas respeitava a mãe e a crença dela.
A menina era o oposto, tanto que possuía a missão de orar e pedir
proteção para as entidades que protegiam e auxiliavam na jornada da
vida.
A
mãe teve um sonho, uma entidade avisou que a filha, seria médium, e
que aguardasse a hora e deixasse nas mãos das entidades protetoras
da criança, seu dom florescer. A mulher orgulhosa e feliz, aceitou.
Revelou
o sonho para o Pai de Santo, que deu a benção e que ajudaria, a
preparar a menina, para o dia da iniciação.
A
menina admira os caboclos. Deseja ser o caboclo Sete Flechas.
Encanta-se com a dança, força e sabedoria. Não teme Exus e as
Pombas
Giras,
das Pretas Velhas, a Maria do Gongo, a emocionava.
Hoje, no terreiro, foi dia de celebração. Gente honrada com a nova entidade descoberta.
Hoje, no terreiro, foi dia de celebração. Gente honrada com a nova entidade descoberta.
Celebrações,
preces, canções e entidades contentes a celebrando.
Quando
voltaram, ele os esperava. Queria ir também, infelizmente, por algum
motivo que não se sabe, não conseguia sair de noite. Não gostava
de ficar sozinho, ainda mais sem luz, e à casa escura. Ficou
encolhido e sentado no quarto das crianças, em silêncio.
Tinha
aflição e ansiedade, ao saber que a mãe e as crianças chegaram,
se animou, feliz da vida, ao descobrir, que não o abandonaram.
Rapidamente,
levantou e esquivou-se para o canto, na direção da janela e
encostou-se na parede.
A
menina entrou primeiro, seguido do menino, que a empurrou.
– Ai! Grosso! – Reclamou.
O irmão botou a língua pra fora.
– Olha, mãe! Tá mostrando a língua pra mim…
– Mentira! Não estou fazendo nada, ela que é chata!
– Mentira! Mostrou sim!
– Ai! Grosso! – Reclamou.
O irmão botou a língua pra fora.
– Olha, mãe! Tá mostrando a língua pra mim…
– Mentira! Não estou fazendo nada, ela que é chata!
– Mentira! Mostrou sim!
E
a mãe, lá do outro lado, falou, de voz nervosa.
– O que tá havendo ai? Se eu sair daqui, pra apartar briguinha dos dois, podem ter certeza que não aliviarei. – Sentenciou.
– O que tá havendo ai? Se eu sair daqui, pra apartar briguinha dos dois, podem ter certeza que não aliviarei. – Sentenciou.
E
a menina, pra provocar, mostrou a língua para o menino, dando o
troco nele.
Trocaram
de roupa, colocaram pijama e comeram, antes de deitar. A mãe comeu
preocupada, algum incômodo, a fez comer lentamente o jantar.
Não
sentava na mesa, ficava mais do lado da menina. A mãe esticou o
olho, nem reclamou, não se importava, com a presença dele, perto da
menina.
– Que a senhora tem, mamãe? – Perguntou a menina, que a tempo observava, a reação preocupante da mãe.
– Tenho nada. Pensando somente. É isso. – Sorriu, um riso inseguro, que não soube pintar muito bem no rosto.
– Come sossegada. – Concluiu.
A menina obedeceu.
Ao deitarem, o menino esboçou uma nova provocação, mas a menina, o alertou do castigo, e ele mudou de ideia na hora.
– Que a senhora tem, mamãe? – Perguntou a menina, que a tempo observava, a reação preocupante da mãe.
– Tenho nada. Pensando somente. É isso. – Sorriu, um riso inseguro, que não soube pintar muito bem no rosto.
– Come sossegada. – Concluiu.
A menina obedeceu.
Ao deitarem, o menino esboçou uma nova provocação, mas a menina, o alertou do castigo, e ele mudou de ideia na hora.
Rezou
para as entidades, os orixás, as bênçãos que recebera do Pai de
Santo, e encerrou com o Pai-nosso.
Deitou,
aguardou a mãe entrar pra dar beijo de boa noite. A luz se apagou,
escuridão, fechou os olhinhos. Haviam vários sonhos pra sonhar,
muitas imagens, para relembrar no dia. Dormiu.
Na
beirada da cama, ele ajoelhou-se próximo do rostinho da menina. Era
tão gracioso olhá-la, ouvir a sua respiração. De leve, acariciou
o rostinho e os cabelos loiros dela. Em silêncio, resmungou uma
boa
noite timidamente. Foi descansar.
Terceiro
Dia:
A
família acordou bem-disposta. Café, pão e leite quentinho.
Passarinhos soaram como bem-vindos, aos ouvidos. O dia começou bem.
As
crianças de uniforme e mochila nas costas, a mãe, na sua maneira
explosiva, ditava ordens, apressou-as, repreendeu uma suposta
discussão entre os dois. Mas tudo terminou bem, conduziu os filhos
na escola, depois, dirigiu-se ao seu compromisso, que não podia ser
adiado, confiante, seguiu, pensando no que viria, no futuro incerto e
cego.
Ele
não tomou café, nem mordiscou o pedaço de pão.
A
casa vazia e silenciosa, era uma tortura. No quarto das crianças,
olhar para o lado de fora, era impossível. Janela fechada e trancada
com cadeado. Abri-la jamais, conhecia o temperamento explosivo da
mulher. Restou a sala, a caminhar na escuridão. A televisão
desligada, o controle remoto largado no sofá, pedindo que tocasse
nos seus botões. Negou pegá-lo, a apertar o botão vermelho e
deslumbrar com o brilho da tela de imagens, do som, das cores, dos
movimentos, das pessoas do outro lado da tela. Preferiu o barulho do
silêncio, como o Preto Velho no altarzinho, ele também prefere
assim. Se buscasse perguntas, para serem esclarecidas, não seriam as
respostas e os conselhos do Preto Velho, que poderiam responder. Mas,
faltava algo. Mas, o que faltava para si? Pedaços, vestígios,
restos, coisas incompletas, parafusos perdidos. O que lhe tem tirado,
que não possa descobrir e adivinhar? Na cozinha, a mesa suja de
migalhas de pão, na xícara, o restinho de café com leite que o
menino deixou. Sentiu o aroma, que ainda restava, mas, o café,
estava frio. Voltou no quarto, desolado, angustiado, sentia muita
falta da família, contou as horas, para o tempo passar e passar.
Parecia
um garotinho feliz, ao ver a mulher entrar.
Não
acenou, e a mesma, nem lhe deu bola. O cansaço tomava conta dela.
Relaxou-se no sofá. Ela cochilou. Ele veio perto e esticou a mão
para tocar o rosto dela.
Desistiu,
ficou de pé, vigiando-a.
Minutos
depois, as crianças entraram. Brigavam, e xingavam um ao outro.
Tapas e pontapés, a mulher assustada, despertou. E gritou.
– Basta! Matarei um por um! Silêncio os dois! Estamos entendidos?
– Foi ela que começou! – Disse o menino, de cara feia.
– Mentiroso! É você que começa! – Reclamou a menina.
– É você a mentirosa!
– Sou não!
– É sim!
– Quietos! Já falei. Quietos, caramba! – Falou a mãe, erguendo a palma da mão, pra bater nos dois.
– Basta! Matarei um por um! Silêncio os dois! Estamos entendidos?
– Foi ela que começou! – Disse o menino, de cara feia.
– Mentiroso! É você que começa! – Reclamou a menina.
– É você a mentirosa!
– Sou não!
– É sim!
– Quietos! Já falei. Quietos, caramba! – Falou a mãe, erguendo a palma da mão, pra bater nos dois.
Com
medo pularam no sofá, fazendo carinhas de anjos comportados.
Gostava
das brigas das crianças, e do exagerado nervosismo da mãe. Não o
incomodava, de maneira nenhuma. Não gostava de ficar horas sozinho,
dentro de casa. Queria a rotineira companhia da família.
O
café da tarde correu bem. Não aconteceu briga nenhuma e a mãe,
ficara tranquila, tudo se seguiu, normalmente. Apenas vigiava o
pessoal, sempre do lado da menina. Não entende a razão de preferir
ficar do lado dela. Quando a mulher o viu, não se importou, não
demonstrou nenhum interesse nele. Fingiu.
Depois,
à sala e a TV. De tarde, somente programas feministas. A mulher,
folgada na sua poltrona particular, os filhos, no sofá tramando
rivalidade. No espaço que sobrou, ele ficou caladinho, tímido e
desconfortável. Nem reclamou. Estava muito bem, mesmo no
desconforto.
Eis
que palmas soaram do lado de fora.
A
mãe olhou e não gostou do que viu.
– Quem é, mãe? – Perguntou o menino curioso.
– O senhor Ademar.
– Quem é, mãe? – Perguntou o menino curioso.
– O senhor Ademar.
Era
o proprietário da casa. Ou seja, ela era alugada.
– Não é dia de receber o aluguel. – Comentou com desconfiança.
– Não é dia de receber o aluguel. – Comentou com desconfiança.
Sem
esperar, foi saber do que se tratava da visita. Acabou trazendo o
senhor Ademar pra dentro de casa.
Homem
magro de cabelos ralos, pernas longas e nariz alongado, de calça e
suspensórios marrom. Usava diariamente uma caneta atrás da orelha
direita. Proprietário de dez imóveis e somente uma que não era
alugada. Vivia da renda e do sustento dos aluguéis. Foi funcionário
público, não casou e não teve filhos. Sobrinhos, tinha aos montes,
raramente o visitam. Nunca deu muita bola para a família,
considera-os interesseiros no seu patrimônio, que não era muito,
mas rendia bons lucros.
–
Sente-se,
senhor Ademar. – Pediu a mãe para o homem, que viu as crianças
olhando com carinhas curiosas.
– Ah, sem problemas. Está bom de pé. – Disse.
– Vocês. Já pro quarto. – Ordenou a mãe para os filhos.
– Ah, sem problemas. Está bom de pé. – Disse.
– Vocês. Já pro quarto. – Ordenou a mãe para os filhos.
O
senhor Ademar interferiu.
– Não, não. Podem ficar. É do interesse deles também. – Confirmou.
– E do que se trata? Hoje, não é dia de receber o aluguel.
– Exatamente. Não é o dia. Trago uma notícia ruim, para a senhora, e as crianças.
– Notícia ruim? Que notícia ruim, é pior que a minha pressão alta? – Perguntou a mulher de cara larga.
– Não quero que fique nervosa. Não queria que chegasse a esse ponto. Quero evitar problemas. A senhora entenderá.
– Sim, sim. Deixe de enrolação e diga do que se trata. – Falou demonstrando impaciência.
– Não, não. Podem ficar. É do interesse deles também. – Confirmou.
– E do que se trata? Hoje, não é dia de receber o aluguel.
– Exatamente. Não é o dia. Trago uma notícia ruim, para a senhora, e as crianças.
– Notícia ruim? Que notícia ruim, é pior que a minha pressão alta? – Perguntou a mulher de cara larga.
– Não quero que fique nervosa. Não queria que chegasse a esse ponto. Quero evitar problemas. A senhora entenderá.
– Sim, sim. Deixe de enrolação e diga do que se trata. – Falou demonstrando impaciência.
As
crianças de olhinhos esticados, escutavam de orelha em pé.
Desconfortável
na poltrona, ele encarou o proprietário, de cima a baixo. Pena que
não podia palpitar. Sobrou ver e escutar a conversa.
– Certo,
certo. – Voltou a falar o homem.
– Mais
uma vez, não quero que fique nervosa. A situação é indelicada até
pra mim que…
– Fala logo, homem, está me deixando nervosa! – Falou desesperada.
– Desculpe, desculpe. Não é minha intensão de enrolar. Pois bem, mas é difícil de falar. Está certo, sem enrolação. A senhora e as crianças terão que deixar a casa o mais breve possível.
– Fala logo, homem, está me deixando nervosa! – Falou desesperada.
– Desculpe, desculpe. Não é minha intensão de enrolar. Pois bem, mas é difícil de falar. Está certo, sem enrolação. A senhora e as crianças terão que deixar a casa o mais breve possível.
Posso
lhe oferecer um prazo de três meses para encontrar uma nova locação.
– Disse o proprietário, afinal.
– Quê? Sair da casa? Como assim, sair da casa? Estou pagando direitinho, não devo nada.
– Eu sei. Nunca deixou passar o prazo. Mas o problema, é que estou recebendo pressões de moradoras que não aceitam a senhora no bairro. E se eu perdê-las, como ficarão os meus negócios?
– O senhor fará isso comigo e com meus filhos, porque algumas fofoqueiras não aceitam a gente?
– Lamento. Lamento muito pela situação.
– Quê? Sair da casa? Como assim, sair da casa? Estou pagando direitinho, não devo nada.
– Eu sei. Nunca deixou passar o prazo. Mas o problema, é que estou recebendo pressões de moradoras que não aceitam a senhora no bairro. E se eu perdê-las, como ficarão os meus negócios?
– O senhor fará isso comigo e com meus filhos, porque algumas fofoqueiras não aceitam a gente?
– Lamento. Lamento muito pela situação.
Estou
recebendo pressões por todos os lados. Aceite, que é melhor a
senhora e seus filhos, encontrarem outro lugar, do que a mim que
perderá mais gente.
– Está pensando nos seus lucros e não no meu problema? Tenho crianças pequenas. Onde, em qual lugar, sairei com elas?
– Tenho contrato de três meses. Três meses de prazo, tempo justo para encontrarem outro lugar.
– Está pensando nos seus lucros e não no meu problema? Tenho crianças pequenas. Onde, em qual lugar, sairei com elas?
– Tenho contrato de três meses. Três meses de prazo, tempo justo para encontrarem outro lugar.
O
senhor Ademar carregava no braço uma male tinha de couro. Vasculhou
minuciosamente e retirou o que procurava.
– Aqui! O contrato. Pegue. A senhora assina e ficamos acertados. É o que posso lhe oferecer.
– Aqui! O contrato. Pegue. A senhora assina e ficamos acertados. É o que posso lhe oferecer.
Passou
o papel para a mulher. As crianças observavam o rosto avermelhado da
mãe, que as deixavam de olhos arregalados e assustados.
– Pare! A senhora não pode….
O senhor Ademar tentou inutilmente deter a mulher, que com raiva, rasgou o contrato.
– Não devia ter feito o que fez! Está louca?- Falou alto o homem.
– Sai daqui velho, aproveitador, Saia!
– Foi um erro, um erro! Prejudicou a senhora mais ainda!
– Saia, anda logo. Saia!
– Pare! A senhora não pode….
O senhor Ademar tentou inutilmente deter a mulher, que com raiva, rasgou o contrato.
– Não devia ter feito o que fez! Está louca?- Falou alto o homem.
– Sai daqui velho, aproveitador, Saia!
– Foi um erro, um erro! Prejudicou a senhora mais ainda!
– Saia, anda logo. Saia!
E
foi, empurrando o proprietário pra fora e ele reclamando da burrice
que ela cometeu. Bateu com força a porta. Gritou, berrou, insana, a
pressão aumentou, descontrolada, entrou na cozinha, grise. Quebrou
tudo, descontrolada, berrou, xingou.
– Cornas, fofoqueiras, mal-amadas, filhas da mãe!
– Cornas, fofoqueiras, mal-amadas, filhas da mãe!
Quebrou,
a pressão subiu, nunca se viu tão nervosa. Os filhos amedrontados.
A menina tremeu, o menino, o coração dele, acelerou. Os dois
juntinhos, um abraçando o outro, um cuidando do outro, um protegendo
o outro. A mãe fora de si quebrou o copo e o prato, tudo que
encontrou no caminho. Virou caos, virou pesadelo.
Desorientado e deslocado, com pena das crianças. Coitadinhas, era enorme o medo deles.
Desorientado e deslocado, com pena das crianças. Coitadinhas, era enorme o medo deles.
Não
sabia como impedir. Protegê-los. Era a solução. Sentou perto delas
e o longo braço magro, envolveu-as. Protetor, ele se acostumou com
essa gente que lhe fazia
bem.
De
noite, lá pelas dezenove horas, a mulher se acalmou. A menina ajudou
a levá-la até o quarto.
Chorava,
e a menina, teve um pouco de dificuldade.
Arrumou
a cama da mãe e a colocou pra deitar. Foi rezar aos santos de
devoção da mãe.
Eram
vinte e uma horas. Abriu a porta devagarzinho. Seus pezinhos leves,
mal faziam barulho. Ele veio acompanhando, discreto, acanhado,
temendo a reação da mulher.
A
menina cheirava a sabonete de jasmim, vestido amarelo que combinava
com os cabelos loiros prendidos.
– Mamãe?- Chamou baixinho.
A mulher sorriu para o rostinho sereno da menina.
– Oi, meu anjinho. – Respondeu.
– Vim de ver. Rezei pra iluminar e cuidar da senhora.
– Obrigada, querida. Agora estou bem. Desculpa por assustar você, e o seu irmão.
– A gente entende.
– Que bom, querida. Vem pra cá, deita aqui com a mamãe.
– Mamãe?- Chamou baixinho.
A mulher sorriu para o rostinho sereno da menina.
– Oi, meu anjinho. – Respondeu.
– Vim de ver. Rezei pra iluminar e cuidar da senhora.
– Obrigada, querida. Agora estou bem. Desculpa por assustar você, e o seu irmão.
– A gente entende.
– Que bom, querida. Vem pra cá, deita aqui com a mamãe.
E
deitou, sentiu o calor e a respiração da mãe.
– Preciso que cuide mim.
Abraçou a menina, que quietinha sentiu o aconchego gostoso da mulher.
– Preciso que cuide mim.
Abraçou a menina, que quietinha sentiu o aconchego gostoso da mulher.
Na
beirada da cama, ficou emocionado com o amor das duas. Resolveu
também deitar, tinha espaço e conseguiu, esticou novamente o braço
longo e magro. Abraçou a mulher, que deu um chega pra lá nele. Com
jeitinho se ajeitou, repetiu o mesmo gesto e movimento, desta vez,
obteve sucesso.
Um
tempo depois, a mãe dormiu. A menina saiu sem fazer barulho. Eram
vinte e duas horas e à noite, se estendeu por todo o bairro…
Quarto
Dia:
Não
sabia
do
motivo de estar
com a família. Estar junto com
eles,
lhe faz bem. Também não sabia
quem era,
se tinha
um
nome, de onde viera,
e de
que
maneira,
chegou na
casa.
Acostumou-se
com eles, sentia
uma
imensa falta, na enorme distancia de horas, quando
ficavam
fora
de casa. Tinha
mais carinho com a menina, o jeitinho dela
de acender a vela e orar, a
energia agradável, uma luz que iluminava,
dando a paz, que não entendia,
o por quê.
A
vela o atraiu,
as orações, pedidos e proteções o atraíram.
Desconhecido, sem pertencer a
família.
Ou
pertencia?
Do nome, não se
recorda. Muito menos, de qual lado surgira.
Ele
queria
entender o motivo de aceitá-lo,
de não reclamar ou expulsá-lo,
até porque, era
um
estranho. Às vezes, desconfiava
de que eles
não o sentia,
outras vezes, tinha
certeza, que o enxergava,
porém, negavam
dizer. Se estivesse atrapalhando, o mandariam embora, mas como era
um
hóspede quieto, e
estava apenas
vigiando-os,
não havia
razão pra retirá-lo dali.
Hoje,
acordaram preocupados. Falaram pouco. Tomaram o café pronunciando
poucas palavras. O
motivo
principal, era o destino deles, se realmente sairiam da propriedade.
– Não.
Não sairemos. Que se dane as mal-amadas, que não têm
o que fazer. Eu tenho.
Querem
briga, terão briga. Não sou de fugir de nada. – Disse
a mãe com orgulho.
– Pedirei ao Papai do céu ajudar a gente, mamãe. – Disse a menina.
– Isso não adianta coisa nenhuma. – Comentou menino sem fé.
– Adianta sim! – Disse a menina, de cara feia.
– Não. Não adianta!
– Ei! – A mãe socou a mesa e assustou o menino. – Não faça mais isso com a tua irmã, entendeu?
– Tá bom, mãe… Desculpa…
– Não diga que não vale a pena, pois vale muito. Mesmo para aqueles que morreram e não aceitaram a morte e precisam de luz para entrar no céu. – Falou a mãe. – É a missão da sua irmã, iluminar os espíritos desencarnados, que não vivem mais no plano físico e que aceitam a morte e caminham na paz para o mundo de Oxalá.
– Sei disso, mãe…. – Respondeu o filho.
– Pedirei ao Papai do céu ajudar a gente, mamãe. – Disse a menina.
– Isso não adianta coisa nenhuma. – Comentou menino sem fé.
– Adianta sim! – Disse a menina, de cara feia.
– Não. Não adianta!
– Ei! – A mãe socou a mesa e assustou o menino. – Não faça mais isso com a tua irmã, entendeu?
– Tá bom, mãe… Desculpa…
– Não diga que não vale a pena, pois vale muito. Mesmo para aqueles que morreram e não aceitaram a morte e precisam de luz para entrar no céu. – Falou a mãe. – É a missão da sua irmã, iluminar os espíritos desencarnados, que não vivem mais no plano físico e que aceitam a morte e caminham na paz para o mundo de Oxalá.
– Sei disso, mãe…. – Respondeu o filho.
Na
mesa, sem beber,
ele escutou
o que diziam.
Sentiu estranheza no corpo, ao ouvir a palavra, espíritos
desencarnados. Luz,
e mundo
de Oxalá.
Rejeitam
a morte, vivem no plano físico, consideram-se vivos. De qualquer
forma, isso
o
atingiu,
não desconfiou
do
motivo
e da razão. Algo que lhe faltava,
desconhecia
em qual parte, se perdera.
Entrou
a
tristeza, entrou
a
angustia. Ninguém o conheceu,
ninguém chamou
seu
nome. Nem o percebeu
na mesa do
café.
Ultimo
Dia: Conclusão
À
noite, a menina acendeu
a vela. No quarto, orando e as mãozinhas juntas concentradas.
Rezou
com devoção e com paixão. Glorificou
as entidades e
os
guias da umbanda. Pediu
proteção, até para as entidades dos Exus,
e que as almas, seguissem
tranquilas e em paz, para o reino do Papai do céu.
Ele
assistia a menina,
no canto da janela, atencioso.
O vento, entrava.
Vento frio, arejando.
A luz da vela, chamava,
a menina,
o tranquilizava.
Paz, paz era
o que, fortalecia.
A mãe chamou a menina, lá da sala.
– Terminou?
– Já, mamãe. – Respondeu.
– Vem pra cá. Feche à janela, a novela está começando. – Avisou.
– Tá bom. Estou indo.
A mãe chamou a menina, lá da sala.
– Terminou?
– Já, mamãe. – Respondeu.
– Vem pra cá. Feche à janela, a novela está começando. – Avisou.
– Tá bom. Estou indo.
Ela
olhou
na direção da janela. Na direção, que
ele se encontrava, naquele instante.
A menina levantou e caminhou. Ele ficou parado e surpreso, sem se mexer. Ela andou ao encontro dele, rostinho sereno e cabelos loiros escorridos. A vela ardente, iluminava. A lufada de frio, invadia o pequeno quarto.
A menina levantou e caminhou. Ele ficou parado e surpreso, sem se mexer. Ela andou ao encontro dele, rostinho sereno e cabelos loiros escorridos. A vela ardente, iluminava. A lufada de frio, invadia o pequeno quarto.
Parado,
observou
a menina,
se
aproximando.
Será que o viu? Sim,
ela o
viu
e sorrindo, caminhou.
Seu
ser se felicitou,
alegre, muito alegre. A menina
o
reconheceu,
que não era
nenhum,
invasor
invisível. Alegre, muito alegre. Abriu
os braços para
recebê-la, e dar boas vindas. Sorriu,
acreditando
que existia.
A
menina atravessou.
Atravessou
o corpo dele.
Não houve
dor,
não sentiu
nada. Atravessou. Ela
fechou
a janela. Da mesma forma, atravessou
outra vez,
como se atravessasse, uma cortina invisível. Verificou
o quarto, antes de sair. Apagou
a luz e fechou
a porta.
Trevas
e solidão. Triste, sentou
na cama. Não aceitou
o que era,
não aceitou
o que era…
Frustrado, desiludido e inconformado, colocou a mão no rosto. Clamar alto, não resolveria. Desabafar, seria inútil. Não sabia para aonde ir, e aceitar que não passava de uma….
Sobrou o risco da lágrima, a lacrimejar. Sobrou o choro a dominar.
Frustrado, desiludido e inconformado, colocou a mão no rosto. Clamar alto, não resolveria. Desabafar, seria inútil. Não sabia para aonde ir, e aceitar que não passava de uma….
Sobrou o risco da lágrima, a lacrimejar. Sobrou o choro a dominar.
E
a
alma penada, chorou.
(Rod.Arcadia)
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