Encontrei o Sr. Jonas por
acaso.
Nem o reconheci. Magro,
semblante melancólico, cabelos ralos, o rosto seco e os olhos azuis
sem brilho.
Ele parou, olhou pra trás,
não reconheceu.
Depois surpreso, lembrou.
– Cresceu muito. – Confessou.
– Cresceu muito. – Confessou.
O Sr. Jonas não era a mesma
pessoa de quinze anos atrás.
– Eu sou um escritor
morto. – Acabei de perder a vida naquela esquina. Vê as luzes da
ambulância e da viatura?
Haviam luzes e movimentos de
pessoas.
– Acabei reagindo no
assalto e levei tiro. – Voltou a falar.
Na atual situação ou
problema que passava, convidei o Sr. Jonas a me visitar.
– Terá prazer em receber um morto em tua casa?
– Terá prazer em receber um morto em tua casa?
Gargalhei, infelizmente o
deixei sem graça.
Dei o endereço e avisei que
visitasse daqui a dois dias.
– Acredite jovem, morri e
o meu corpo está na esquina.
Observei se afastar após
algumas esquinas.
O Sr. Jonas era um grande
escritor não famoso.
Nunca publicou, as editoras
recusaram. Pobre dele, e
Cretinas as editoras de não
reconhecerem o verdadeiro talento.
Li cinco romances e dois
livros de contos. Se tornou meu escritor favorito. Mas, ele sumiu,
sem deixar vestígios e foram quinze anos.
No dia que o Sr. Jonas
desapareceu, saí na rua e chamei-o na esperança que surgisse, os
vizinhos reclamaram e nada dele.
Aos prantos falei que o Sr.
Jonas sumiu e meu pai consolou.
– Ele volta, filho.
Ele não voltou.
Tentei montar um jornal em
sua homenagem, recusaram.
– Lamento, não
montaremos jornal para um cidadão que nunca ouvíramos falar.
Apelava. Quem não conhecia
o Sr. Jonas?
– Sinto muito, jamais vi mais gordo.
– Sinto muito, jamais vi mais gordo.
Tinha esperança que o Sr.
Jonas seria encontrado e esse dia chegou.
Ele chega do mesmo jeito,
toca minha mão e sinto arrepio que me remexe.
– Desculpe, minha mão é um gelo. – Explica.
– Não há nada para se desculpar.
– Você era jovem naqueles tempos e veja só, virou homem.
– Quinze anos passados.
– Senti tua falta, de uma hora pra outra o senhor some, sequer vestígios.
– E voltei. Mesmo morto.
– Sou teu único leitor, leitor favorito e fiel.
– Agradeço. Voltei para que faça um favor para mim.
– Estou as tuas ordens.
– Em três dias haverá meu enterro.
– O senhor com seu humor.
– Falo sério, quem está diante de ti, é um morto.
– É difícil não levar a situação para brincadeira.
– Sem brincadeira, estou morto realmente.
– Continue, senhor.
– Daqui a três dias meu enterro. Antes de partir definitivamente quero que me conduza aos meus companheiros. É o meu desejo, faça isso e partirei satisfeito.
– Farei tudo para alegrá-lo.
– Sempre soube disso.
– Desculpe, minha mão é um gelo. – Explica.
– Não há nada para se desculpar.
– Você era jovem naqueles tempos e veja só, virou homem.
– Quinze anos passados.
– Senti tua falta, de uma hora pra outra o senhor some, sequer vestígios.
– E voltei. Mesmo morto.
– Sou teu único leitor, leitor favorito e fiel.
– Agradeço. Voltei para que faça um favor para mim.
– Estou as tuas ordens.
– Em três dias haverá meu enterro.
– O senhor com seu humor.
– Falo sério, quem está diante de ti, é um morto.
– É difícil não levar a situação para brincadeira.
– Sem brincadeira, estou morto realmente.
– Continue, senhor.
– Daqui a três dias meu enterro. Antes de partir definitivamente quero que me conduza aos meus companheiros. É o meu desejo, faça isso e partirei satisfeito.
– Farei tudo para alegrá-lo.
– Sempre soube disso.
Ele sorri. Um riso alegre de
prazer.
– Amanhã. Amanhã realizaremos nossos objetivos.
– Amanhã. Amanhã realizaremos nossos objetivos.
Abre a porta e vai, e de
costas com a mão levantada se despede:
- Adeus.
- Adeus.
Espero o dia nascer com
ansiedade e de manhã o Sr. Jonas chega. Está de calça e casaco
preto e chapéu branco na cabeça.
– Pronto? – Pergunta.
– Mais do que nunca.
– Pronto? – Pergunta.
– Mais do que nunca.
Dirigimo-nos num hotel de
cor avermelhada.
Subimos à escada de madeira
carcomida e batemos no número 22.
Um senhor de cabelos ralos,
branco de óculos, pijama verde atende. Seus olhos brilham de
contentamento ao encontrar o Sr.Jonas.
Muita emoção nos seus
abraços.
Entramos, colocam à
conversa em dia.
A conversa dura duas horas,
saudades a serem desfeitas.
Deixamos seu Lineu e
seguimos em outro bairro, numa casa de fundo de portão enferrujado.
O Sr. Jonas pede que eu bata
palmas. Aparece um senhor de cabelos crisalhos. O Sr. Jonas o saúda e
alegre nos recebe.
Entramos. O Sr. Jonas revela
que o amigo é um excelente poeta.
– Mistura de Rimbaud e
Manuel Bandeira. – Define.
O amigo de nome Carlos
Manuel mostra manuscritos e vejo grandiosa riqueza. Como alguém
recusa um material de riquíssima qualidade?
– É o sistema, jovem.
Bruto e decadente. – Explica o Sr. Carlos Manuel.
Da conversa agradável
partimos para outro bairro. Paramos numa casinha e no quintal um
velho com chapéu de palha, camisa xadrez e chinelo. Cuidava do
canteiro de margaridas e orquídeas.
O Sr.Jonas chama e o dono da
casinha demora pra reconhecer. Pergunta quem é. E o Sr.Jonas abre os
braços e diz:
– Ah, seu macaco velho,
não finja que esqueceu.
Entramos e o velho nos
abraça calorosamente.
Convida a entrarmos, dá
café que a gente bebe, nos conta da vida, ele e o Sr. Jonas
conversam das coisas que movem o mundo e de coisas antigas.
– Levei tiro.
O Sr. Jonas abre a camisa e
mostra a marca da bala. Fico arrepiado e horrorizado.
Despedimo-nos e entramos no
restaurante. Pedimos arroz, feijão e bife. Bebíamos Tubaína e
voltamos para casa.
– Revi meus companheiros,
estou muitíssimo satisfeito. Peço-te o último pedido.
– Peça que faço com
maior prazer.
– Seja acompanhante do meu velório.
– Senhor, ainda com essa ideia?
– É o último pedido.
– Seja acompanhante do meu velório.
– Senhor, ainda com essa ideia?
– É o último pedido.
Paramos de frente ao meu
portão. Não negaria um favor ao Sr. Jonas.
– Conte comigo.
– Agradecido.
– Conte comigo.
– Agradecido.
De manhã ele inteiro de
preto surge.
Considerando absurdo
pergunto o horário do enterro na qual responde com naturalidade.
– Estamos atrasados, o
enterro será às onze e meia.
Verifico no relógio.
Verifico no relógio.
– São dez e vinte, temos
tempo. – Digo.
– Chegaremos adiantado, quero acompanhar e assistir cada movimento.
– Chegaremos adiantado, quero acompanhar e assistir cada movimento.
Não sei, algum problema o
afeta.
Dizer que está morto e assistir o próprio velório é assunto grave.
Dizer que está morto e assistir o próprio velório é assunto grave.
Não tenho coragem, de que
precisa de especialista, trairia sua confiança.
Entramos no bairro. Casas de portas e janelas fechadas, rua vazia e silenciosa. Os comércios fechados. Ninguém.
Entramos no bairro. Casas de portas e janelas fechadas, rua vazia e silenciosa. Os comércios fechados. Ninguém.
No entanto, lá no fundo,
bem lá no fundo, uma casa despercebida sem chamar atenção e
discreta, exibia porta e janelas abertas.
É pra ela que caminha o Sr.
Jonas. Retive. Ele dá alguns passos e não sente minha presença.
Vira para trás. Indica com a cabeça para que continue e anda.
Tento falar, a boca trava. Ando.
O Sr. Jonas de frente à
casa com janelas e porta aberta. Dentro uma fraca iluminação, não
se distinguia se havia alguém lá. Sem som, cântico, reza ou
falatório. Silêncio.
O Sr. Jonas abre o
portãozinho e fala:
– Daqui por diante tomará
a frente, cheguei onde fui permitido e o momento chegou. Siga
sozinho. Agradeço a maravilhosa companhia que tivemos. Adeus.
– Sr. Jonas? Não
entrará?
– Aqui eu me despeço. Prossiga adiante.
– Não entendi, viemos para o seu…
– Aqui eu me despeço. Prossiga adiante.
– Não entendi, viemos para o seu…
Ele me interrompe.
– Velório? Teu velório, quer dizer?
– Velório? Teu velório, quer dizer?
Mesmo na simplicidade e
ingenuidade ainda me assusta, mesmo que a voz seja sincera.
– Senhor…
- Jovem, ainda não entendeu. Sou você mais velho ou que deveria ser. Você é Jonas. Infelizmente um disparo apagou teu destino. Um disparo e a tua história no mundo se concluiu. Eu me encerro neste ponto. Até.
- Jovem, ainda não entendeu. Sou você mais velho ou que deveria ser. Você é Jonas. Infelizmente um disparo apagou teu destino. Um disparo e a tua história no mundo se concluiu. Eu me encerro neste ponto. Até.
O Sr. Jonas balança a mão
timidamente e desaparece lentamente.
– Sr. Jonas…
– Sr. Jonas…
As vozes emergem. Cantoria?
Cantoria, cânticos, preces
e louvores. O cântico termina. Começa a Ave-Maria.
São vozes femininas, vozes
de senhoras, rezando a Ave-Maria.
E os passos na casa de
janelas e porta aberta, um velório.
Senhoras ajoelhadas com
terços rezam e no meio da sala o caixão velado.
A casa iluminada com velas
de sete dias. Ocorre a vontade de aproximar, meus anseios impedem.
Caminho.
As senhoras rezam com seus dedos suados no terço, estão no terceiro
mistério e sigo o meu cortejo no meio delas. Ao passar próximo de
uma, ela estremece, outra de soslaio seu rosto contrai de pavor. A
que comanda a reza, sua voz muda de tom, mais densa, pesada e as
restantes seguem no ritmo.
Ao aproximar do caixão,
vejo a revelação.
E arrepio, vendo-me deitado num triste sono eterno…
(Rod.Arcadia)
E arrepio, vendo-me deitado num triste sono eterno…
(Rod.Arcadia)
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